domingo, 21 de fevereiro de 2010

O beijo de Nuit



Hoje eu vou me matar.

Muitas pessoas afirmam isso diariamente, mas quase nenhuma tem realmente coragem para consumar o fato.

Mas hoje eu vou me matar.

Está decidido.

Não é uma decisão fácil, levei anos para ter certeza que essa é a melhor opção.

Melhor opção.

Parece uma piada sem graça, minha vida nunca teve muita graça mesmo.

Já ouvi falar que a única diferença entre o suicídio e o martírio é a cobertura da mídia, se for assim, serei apenas mais um anônimo, entrarei para as estatísticas e me tornarei um pobre coitado na boca das pessoas, um rapaz que estava no fundo do poço e não suportou as regras desse jogo mesquinho chamado vida.

Dramático não?

É, também acho.

Não acredito em nada disso.

Quero apenas sumir.

Eu, talvez seja o único rapaz dessa cidade que tenha um profundo conhecimento sobre a alma humana, essa solidão me ajudou a chegar nesse ponto.

A ignorância é uma benção que não dei o devido valor.

Mas vamos parar de conversa fiada, e vamos ao que interessa, meu último movimento nesse jogo.

Escolhi o lugar com cuidado, afinal de contas, não vou deixar nenhuma carta explicando o que fiz, ou porque fiz, se quiserem me entender terão que observar os detalhes.

Rios.

Rios são lugares interessantes. Quase sempre poluídos, mas nasceram limpos, puros, inocentes. E vão acabar perdendo a sua identidade cedo ou tarde, em uma grande massa, oceano.

Será em um rio, está decidido.

No caminho para o ponto determinado vejo um artista de rua falando sobre a beleza das teias de aranha presentes na ponte em que estou atravessando. Faltam poucos metros para morrer, vou parar um pouco para ouvir o que ele tem a dizer, a morte pode esperar.

Ele fala das formas geometrias, da mais pura artesã da natureza, do trabalho infindável.

Que coisa chata, deveria ter ido encontrar a morte logo.

Se eu tivesse um pouco mais de disposição teria lhe contado para que serve uma teia de aranha.

Para matar.

Sim, o que julgamos belo é apenas uma arma, com qualquer outra.

A beleza atraindo para a morte, poderia ter feito o meu TCC sobre isso, mas escolhi falar sobre a relação da água e o subconsciente.

Existe um deck no rio, é lá que vou dar meu ultimo mergulho.

Mas já tem uma pessoa lá, o que devo fazer?

Será que não se pode mais ter privacidade nos dias de hoje?

Involuntariamente meus passos cambaleiam.

O honorável estranho me vê e se levanta, devia estar aqui para ver o pôr do sol, o encontro de Rá com Nuit é sempre belo.

Qual será o gosto do beijo de Nuit?

Vou descobrir em breve.

Ao passar por mim o estranho joga uma moeda para trás, e não vê o resultado.

Também não me interesso pelo resultado.

Vou me jogar agora.

Tudo é escuro dentro de um rio.

A realidade como conhecia está se apagando.

Está se apagando.

Se apag...

4 comentários:

Ludmilla disse...

A ignorância é uma bênção mesmo.

"A dúvida é o preço da pureza. E é inútil ter certeza." (H.G.)

Ah, tem que ser muito loser pra conseguir se matar pulando do deck da Ponte Velha. O Pikachu tava certo em virar as costas e ir embora.

Wolv disse...

Pika... não poderia ter completado melhor!!

Tarso "Carioca" Santana disse...

É, pelo menos agora sabemos que as chances do cadango morrer são altas...
hehehe

E acho que temos um problema com direitos autorais
hhehehe

Wolv disse...

Perdão.
Sr. Santana... não poderia ter completado melhor!!