sexta-feira, 23 de setembro de 2011

Agradecimento ao Invisível



Já passei por alguns momentos bem difíceis na minha, ainda curta, vida. E nas horas de aperto sempre recorri ao Invisível. Já o chamaram de muitas coisas, Deus, acaso, coincidência, o nome não importa, o que importa é o que acontece.

Pode ser na noite mais escura, aquelas do tipo que o frio e as trevas fazem você esquecer que uma hora o sol nascerá novamente que costumamos pedir ajuda a trupe do Invisível. E invariavelmente eles nos ajudam. Podemos não perceber no momento, mas eles ajudam.

Por isso que gostaria de agradecer a esse (ou esses) amigo(s) Invisíveis que têm sempre me apoiado nos caminhos que sigo.
Gostaria de agradecer por todos os amigos, mulheres, familiares e experiências que eles têm me proporcionado viver e encontrar.

Gostaria de agradecer, como o poeta um dia já fez, ao Invisível por ter me dado uma alma invencível, que mesmo tento passado por dificuldades em algumas batalhas tem a certeza que sairá vitoriosa dessa vida.

Do fundo do meu inexperiente e algumas vezes tolo coração, obrigado.

domingo, 11 de setembro de 2011

Ares e Afrodite




Por me proteger, não posso te abraçar.

Por te abraçar, não posso me proteger.

quarta-feira, 7 de setembro de 2011

Bumbá


Num passado distante, lá pras bandas do sertão agreste, havia uma fazenda. Nessa fazenda criavam-se bois. Bois de toda espécie, o dono da fazenda era um amante da pecuária, adorava todas as suas rezes, entretanto, a nenhuma amava tanto quanto a Bumbá, seu boi de estimação.
Amava tanto esse boi que um dia chamou seu vaqueiro de confiança, Tião, e assim com ele proseou:
- Tião, venha cá homi. Te chamei aqui pelo seguinte. Quero que você tome conta de meu boi Bumbá, meu boi preferido, o mais bonito da minha fazenda todinha. Esqueça o restante da boiada, deixe-a para os outros vaqueiros, sua responsabilidade é só Bumbá!
- Pois certo, patrão!
Essa foi a resposta de Tião diante de tal honraria. Passado um tempo nessa condição, contente que só, Tião chega em casa, pra encontrar com sua mulher que estava grávida.
- Ô Tião...
- Diga minha frô.
- Eu tô com um desejo Tião. De cumê um negócio...
- Diga minha frô de quaresmera, o que ocê quisé!
- É mesmo Tião?
- Claro, eu lá vô nega um desejo teu e arriscar meu mulecote que tá aí dentro?
- Pois Tião, eu quero comer língua de boi, mas não é de qualquer boi não. Quero a língua do boi mais bonito e vistoso dessa fazenda, quero a língua de Bumbá!
- Ochê... Lascou-se.
E agora, o que Tião faria? Ceder a vontade de sua mulher seria trair seu patrão, mas desejo de grávida não se nega, seria arriscar sua prole.

Por fim, após muita amolação,
a mulher convenceu Tião.
O Jeito era matar o boi
e sumir pelo sertão!
Desta feita foi Tião,
logo o boi assassinar.
Armado de seu facão, ia o boi imolar
e com pesar no coração seu patrão sacanear!

Feito o delito, e alimentada a sanha da mulher, Tião se embrenhou no mato pra modo de se esconder de seu patrão.
Este, ao dar falta de seu boi entrou em desespero, e bradou aos céus:
- Deidades mórbidas de um panteão caído! Que mil pragas caiam sobre os céus e a Terra por permitirem que sumissem com meu boi!
E mandou que caçassem por toda a fazenda Tião, que deveria dar contas de Bumbá. No fim da noite os empregados vieram informar que Tião não foi possível encontrar, acharam rastros entrando na mata, mas essa era região de índios, e animais ferozes, que cristão algum ousava entrar. Recomendaram também que o patrão tomasse um chazinho de erva-doce, para os nervos acalmar.
- Chá hei de fazer com vossos ossos desgostosos boçais! Se cristão não adentra nesta mata tragam a mim os Potiguás!
E os Potiguás vieram, e em troca do boi lhes foi oferecido uma colcha de tamanduás e um travesseiro de vagens de ingá.
Os índios olharam torto, queriam mais, e por fim o patrão ofereceu um broche espelhado, herança de sua bisavó, alcoviteira renomada das terras de além-mar.
Com tamanho tesouro em mãos os Potiguás partiram floresta a dentro e acharam Tião junto do boi. Trouxeram e apresentaram o cadáver ao patrão:
- Aí mas que desolação! Tião, por que me traíste de tal forma?
Então Tião foi se explicar, usou em sua defesa o argumento de que com desejo de gestante não se bule. É coisa com a qual não se pode brincar! O patrão ficou danado, a surra ia começar, esbravejava ao sete ventos, alguém ia se lascar!
Mas eis que o pagé da tribo veio Tião socorrer:
- Vamos ressuscitar o boi, homem branco há de ver!
E com cantos, tambores e gritos, o pagé estremeceu, urrou uma, duas vezes... e o boi por fim cedeu, recuperou os movimentos e se pôs a caminhar.
O patrão todo contente, começou logo a cantar:

Uma festa, ochê, oi,
É o que hoje vamos ter!
Ressuscitaram meu boi,
venham todos, venham ver!

E de tão feliz que ficou o fazendeiro matou uns 50 bois de seu rebanho e alimentou muita gente.
Assim (re)nasceu Bumbá, o boi zumbi que mugia no sertão, afugentando os vaqueiros e os portugueses desavisados. Com medo de tal criatura muitos irmãos lusos voltaram para as terras de além mar. Os poucos que por aqui restaram tiveram de descobrir como lidar com tão medonha criatura, invocada dos mortos pelos Potiguás pra modo de se vingarem dos portugueses. Após estudos diversos conseguiram traduzir do tupi o amofinado nome Bumbá, que significa: Aquele que teme fornos de assar pães.
E desde então os portugueses restantes se resguardam em padarias, com medo do Boi-Bumbá.

P.S.: Um erro na tradução para o mandarim foi o responsável pelo atual surto de "pastelarias" chinesas no país.






domingo, 4 de setembro de 2011

Mas, quem quer?



São três da tarde, o dia está frio e nublado. Na área de lazer da creche os pequenos Felipe e Mariana brincam com giz de cera.
Felipe desenha seu cachorrinho novo, ele o ganhou de presente no último fim de semana, ainda não escolheu um nome para ele. Mariana desenha a si própria no meio de flores.
Sem desviar os olhos de seus desenhos ambos conversam.
- Ô Mariana, o que você tanto falava com a Tia Júlia hoje? Você fez algo errado? Ela estava te dando uma bronca?
- Não... É que meu pai me falou que queriam derrubar a creche, aí perguntei pra ela se era verdade.
- Não vão derrubar nada sua boba.
- Ah é? pois ela disse que talvez derrubem sim!
Retirando os olhos de seu desenho pela primeira vez Felipe indaga: - Mas quem quer?
- Ah, assim, a tia disse que não é bem querer, mas que os moços precisam derrubar a creche pra passar com a rua...
- Que rua?
- A rua que vai tirar o engarrafamento da cidade, porque quase todo dia quando agente sai daqui tem engarrafamento.
Felipe parou de desenhar por um instante e olhou em volta, para o gramado, para o caminho por onde os estudantes da faculdade passavam todos os dias, para as grandes construções que eclipsavam a pequena creche naquele ambiente universitário e pensou, mas que rua seria essa? E pra onde será que ela levaria tantos carros assim, a ponto de desengarrafar a cidade? E, principalmente, por que ela teria de passar por cima de sua creche?
- Mas você não disse quem que quer fazer isso Mariana.
Mariana suspirou e olhou para Felipe com um arzinho de reprovação balançando a cabeça. Sempre que seu irmão insistia em uma mesma pergunta sua mãe suspirava e olhava para ele dessa forma, ela achava engraçado.
- Felipe, já disse que a tia Lúcia me falou que não é por querer, é porque eles precisam passar com a rua por aqui.
- Eles quem? Insistiu o garoto já levemente irritado, não entendia essa mania que algumas meninas pegavam dos adultos de ficar circulando uma pergunta ao invés de respondê-la simplesmente. E Mariana adorava imitar os adultos.
- Meu pai disse que é o reitor. Respondeu por fim Mariana.
- O que é um reitor?
- Não sei, olha, está ficando bom meu desenho?
Felipe meneou a cabeça em sinal positivo e se levantou caminhando até a jovem monitora que neste momento estava redigindo alguns relatórios enquanto as crianças desenhavam. Chegou próximo a ela e indagou sobre o que era um reitor e porque ele queria fazer uma rua por cima da creche.
Lúcia, pega de surpresa, tentou explicar da forma mais simples possível.
- Olha Felipe, o projeto dessa rua foi feito pela prefeitura e pela reitoria, pelo que sabemos, e eles querem melhorar o trânsito da cidade com isso.
- Mas o que é um reitor?
- Reitor é uma pessoa que faz parte da universidade e na qual as pessoas votaram para que ele tomasse conta dela.
- E o que é votar?
- Funciona assim, alguém se candidata, ou seja, pergunta se você aceita que ele tome conta da universidade, se você aceitar você vai e dá seu voto. Que é como se você dissesse "Eu aceito que você tome conta da Universidade sendo o reitor". Com o prefeito também é assim, só que para cidade.
- Então o reitor toma conta da universidade pra gente?
- Sim.
- E o prefeito da cidade?
- Sim. Eles fazem coisas que ajudem os estudantes da universidade e os moradores da cidade.
- E essa rua vai ajudar quem?
A monitora ficou pensativa, Felipe não gostava desse olhar pensativo de gente grande. Ele sempre era seguido de uma mudança de assunto, ou de um embaraço que impedia qualquer explicação.
- Bem... Então... Felipe, a tia não sabe bem do que se trata o projeto, nada foi divulgado muito claramente, nem sabemos ao certo se a rua vai mesmo passar por cima da creche. Então vou ficar devendo uma explicação detalhada pra você, certo? Mas não precisa se preocupar, se precisarem passar por aqui com a rua vão remover agente pra outro lugar, e vai ficar tudo do mesmo jeito.
Felipe pensou um pouco, olhou para o céu salpicado de nuvens no fim da tarde.
- Tá bem. Disse o garoto resignado. - Agente podia chamar esse tal reitor pra vir aqui um dia. Pra brincar com agente, eu posso emprestar um brinquedo pra ele, ele pode ouvir você contando histórias, participar do lanche, aí ele vai ver que aqui é bom, e não vai mais derrubar.
- Ai, ai, Felipe, acho que o reitor não tem tempo de ficar brincando em uma creche. Disse Lúcia rindo. - Ele é um homem ocupado, que trabalha muito.
- E para que ele trabalha tanto?
- Pelo mesmo motivo que tantos adultos trabalham muito, para poder ganhar dinheiro.
- Para que ele quer ganhar muito dinheiro se ele não tem tempo nem para brincar? Disse Felipe mais para si próprio do que para a monitora. Após essa reflexão ele voltou para seu desenho. Decidiu que chamaria seu cachorrinho de Ben, por causa do Ben 10.
- Como vai ficar do mesmo jeito? Pensava Felipe. - Se agente sair daqui não vai ter mais essa pedra onde a tia senta pra contar histórias, não vai ter o ninho de quero-quero nos fundos da creche e nem o pessoal da faculdade que de vez em quando vem aqui.
- Então Felipe, descobriu o que é um reitor? Perguntou Mariana desenhando os últimos detalhes de suas flores.
- Sim, é alguém que pergunta se pode ajudar. Aí, depois que deixamos, passa a fazer o que quer, e nem diz pra gente quem está ajudando.
Depois começou outro desenho, começou a desenhar aquela pequena casa cercada de prédios suntuosos, para que tivesse algo para lembrar, quando as gargalhadas fossem substituídas pelo ronco dos motores, as várias cores da fachada pelo cinza do asfalto e os sonhos livres das crianças pelo utilitarismo do progresso.