sábado, 20 de novembro de 2010

Histórias de Ninguém - 2

Trafego pela Avenida Presidente Getúlio Vargas no Centro do Rio de Janeiro, ao meu lado no banco traseiro do Sedan Premium está meu sócio. O motorista imprime velocidade, quase não há trânsito por ser sábado, diga-se de passagem um péssimo dia para uma reunião da firma.


Olho pelos vidros fumês e assisto o espetáculo do Oxímoro Carioca que deixa no mesmo plano a miséria de muitos e a opulência de poucos. Anastácio, meu sócio, fala sobre o temor de que os investimentos internacionais mudem o fluxo devido a possíveis alterações administrativas realizadas pelo governo vindouro. É bom ter alguém precavido no trabalho, mas não vejo isso como uma preocupação já que se manterá a plataforma política.


Ele não para de falar, já repetiu a frase "Temos que ter cautela com as ações" seis vezes durante o percurso da avenida, está incomodado porque acha que não estou prestando atenção no que está dizendo. Não demonstro atenção porque já pensei sobre esse assunto e deixei as medidas preventivas para qualquer problema nas mãos dele.


O motorista diminui para para entrar no retorno, vejo um senhor de aproximadamente 60 anos sem camisa se barbeando com a água que escorre de um encanamento enferrujado. Metros depois uma garota em seus 17 anos trajando o uniforme de uma escola pública de educação infantil seduz um menino de no máximo 9 deixando à mostra parte de sua calcinha.


À frente do carro do lado esquerdo vai uma moto e atrás desta um Fiat 147. Vamos entrar na próxima rua. O motoqueiro sinaliza com a seta que vai mudar de faixa, o sol e a desatenção de meu motorista impedem-no de ver isso. Vamos bater, não dá tempo de fazer nada, ou de falar, só tenho tempo para olhar o painel: 57Km/h.


Ouço o som abrupto da buzina seguido da frenagem, o motorista tenta desviar, mas para o lado errado, em direção ao outro carro. O motoqueiro é atingido na traseira e cai, os dois carros se chocam , o Fiat vai para o centro da pista, meu carro atinge um poste frontalmente.


Dois baques fortes, seguidos de solavancos do cinto de segurança e uma batida de cabeça no vidro.


Respiro fundo. Anastácio está inclinado chutando a porta, uma péssima ideia, movimentos bruscos agravarão qualquer traumatismo que tenha ocorrido. Olho para o Caput amaçado, o motor sofreu danos, o carro foi atingido lateral e frontalmente, logo o tanque de combustível pode estar vazando, calculo que 15 segundos seja um tempo seguro para sair do carro. Perdi 4 segundos nesses pensamentos, Anastácio continua chutando a porta da direita, antes de me mover movimento os dedos dos pés e das mãos enquanto ensaio movimentos faciais. Minha cordenação motora fina está estável, vias eferentes e eferentes parecem bem. Mais 3 segundos nessa auto análise. Com uma mão retiro o cinto enquanto estico a outra e simplesmente destravo a porta, em momentos de desespero as pessoas devem lembrar de não tomar atitudes desesperadas. Saio do carro, piso no asfalto contando 13 segundos, me afasto um pouco, tento perceber cheiro ou marcas de gasolina pelo asfalto. Não há vazamento aparente. Caminho até a porta do motorista. Ele está desacordado com um sangramento na testa. Abro a porta com a chave extra que possuo. O pulso dele está estável, melhor não retirá-lo do veículo sem imobilizar o pescoço. Ligo para a emergência ainda ouvindo chutes na porta do carro, contei 13 até agora, acho que Anastácio tem visto muitos filmes de ação.


Após chamar o socorro vejo meu sócio saindo pela porta que eu abri. Em minha direção vêm o motorista do Fiat 147, um homem de meia-idade negro, de aparência forte, mas olhar assustado, e o motoqueiro, um jovem ainda encoberto pelo capacete, com a calça jeans rasgada e a perna sangrando. Ambos se desculpam o motorista acusando o garoto e este assumindo o erro. Olho em volta, o idoso que fazia a barba está incomodado com um corte proporcionado pelo seu material improvisado, o menino olha com assombro o acidente, mas rapidamente volta a olhar para a garota mais velha que agora exibe com um puxão parte do que agora se mostra uma calcinha fio dental. Ela está de costas para o acidente, pede para que ele fale algo, consigo ler obscenidades em seus lábios. Ela o está condicionando, o ensinando a ser mais um membro da multidão de invisíveis que nos rondam. O motoqueiro continua se desculpando.


Olho para os veículos, a moto, uma CB 150, está muito amassada, o Fiat apenas amaçou a porta. Viro e faço dois cheques com o suficiente para os danos, digo que foi um acidente, poderia ter acontecido com qualquer um e peço para o garoto aguardar a ambulância. Meu sócio está desesperado com o acidente, mando-o notificar o seguro e vejo que meu motorista acordou. Digo para que permaneça parado. O dono do Fiat e o motoqueiro ainda olham fixamente para os cheques em suas mãos, sem compreender porque dei dinheiro a eles. Vejo a ambulância se aproximando, seria ótimo se houvesse cura para essa constante ressaca moral em que vivemos. Dou de ombros e me encaminho para a viatura pensando em como é possível que nos mantenhamos cegos àquilo que mais deveria saltar aos olhos enquanto não somos capazes de desviar os olhos de coisas que apenas simbolizam um poder que todos almejam, sem saber o que realmente significa.









domingo, 14 de novembro de 2010

Desculpas de um pessimista

Vou dormir de óculos escuros hoje
sei que, amanhã, de manhã,
o sol não vai brilhar tanto mesmo
fecharei a minha janela ao levantar
sempre há, nem que mínima,
a possibilidade do mundo, nem que só o meu,
acabe, e eu perderia isso.
Irei a um baile de máscaras mais tarde, a tarde
onde não reconheceria ninguém,
nunca reconheço as pessoas com máscaras
Ou, quem sabe, pedirei em casamento a primeira mulher que encontrar
aliás, estranho como meus casamentos acabam
nunca sei o nome, sempre assim, da mulher do meu lado
e depois que chegar em casa
vou pensar, com pesar, contido e contente
em como acordarei bem na manhã seguinte
sem arrependimentos.

domingo, 7 de novembro de 2010

Lembre-se



Você NÃO é especial

sábado, 6 de novembro de 2010

Um novo dia


Hoje eu percebi
que estou cansado de viver
Nesses tempos tão estranhos
que não posso crescer

Nunca encontro um motivo
para comemorar
E as chuvas que caem
mal podem me molhar

E nas fotografias
nenhum sorriso se quer
uma sopa sem gosto
todo dia um colher

Cicatrizes escondidas
por histórias mal contadas
De um dia esquecido
em uma página virada

Todos perfumes
me parecem iguais
e todos agem
como se fossem normais

Se a TV desligou
e não quer mais voltar
vou fazer minhas malas
e me mudar

terça-feira, 2 de novembro de 2010

Inspiração no modismo

Podemos fingir que um avião no céu noturno é uma estrela cadente?!
Eu poderia mesmo usar um desejo agora, um desejo agora, um desejo agora...



e me pego nessa vontade toda vez que um momento se torna um marco...