segunda-feira, 25 de abril de 2011

Cortina de banheiro


Minha namorada mora na pequena cidade de Resende, num pequeno apartamento, dentro do qual há um pequeno banheiro com um pequeno box onde se pode tomar banho. Na primeira noite que dormi por lá foi também a primeira noite em que tomei banho em sua casa. Quando entrei no banheiro, logo de cara já imaginei que teria problemas: o box dela é cercado por uma daquelas cortininhas plásticas. Digo que imaginei porque eu mesmo só havia usado banheiros com cortinas desse tipo quando era moloque e ia passar férias na casa da minha avó em Barra Mansa. Eu tinha muito ódio da cortina do banherio da minha avó porque, não sei como, ela me seguia pelo box enquanto eu tomava banho e aquele negócio gelado ficava encostando em mim.
Bom, eu aprendi muitas coisas desde que comecei a namorar a Ludmilla, e uma delas é que eu tenho mais manias e preconceitos que um judeu velho e solteirão, e que eu definitivamente tenho que mudar isso. Pensando dessa forma entrei feliz no banheiro, esperando nada mais do que um delicioso banho quente. Tirei minhas roupas, abri o chuveiro, calibrei a temperatura e reparei que o amor de mulher com quem tenho a infinita sorte de namorar havia comprado o sabonete de coco que eu gosto para tomar banho. Estava nú e feliz como uma criança. De olhos fechados, aprecio o doce toque os meus dedos lambuzados de xampú e espuma massageando meu cansado couro cabeludo, pensando que terei minha namorada nua em meus braços logo após o banho, quando de repente tenho a seguinte sensação: 
Imagine que você está na praia num dia ensolarado, curtindo de montão com vários amigos, e uns primos dos quais você gosta, e tem aquela gostosa te chamando pra dar um mergulho com ela. Você faz de bobo, um cuzinho doce de leve. Ela sai na frente e insiste na sua presença junto a ela. Você então se levanta, enche o peito de ar, murcha a barriga, levanta a cabeça, eleva os ombros, e com pose de 007 se aproxima da água. Quando esta bate na altura do seu umbigo, uma alga se enrola na sua perna. Bom, você não sabe que é uma alga. Pode ser qualquer tipo de entidade/ser/demônio do mar, e você então começa a abanar os braços e gritar por socorro, tentando sair correndo/nadando/dando xilique o mais rápido possível. Você perde a gata e a moral com os amigos ao mesmo tempo quando, ao sair da água, vê aquele pedaço inofensivo de alga na sua canela.
Bom, tirando o xilique,os gritinhos, a praia, os primos, os amigos, o mar, a alga, e a gostosa me chamando, foi exatamente aeassim que eu me senti. A merda da cortina do banheiro se enrolou na minha perna, e eu com os olhos cheios de xampú não pude ver o que era. Pulei, me afastei, rodei, e a cortina foi se enrolando mais e mais em mim, até que escorreguei e caí no chão, coberto de espuma e cotina. PUTAQUEOPARIUDERODINHA!! Caí, machuquei as nádegas, broxei e ainda tive que colocar a merda da cortina no lugar de novo, porque a Ludmilla não permitiu que eu a jogasse fora.
Depois disso perguntei pra Ludmilla se a cortina a seguia, e ela disse que não, que eu é que não sabia tomar banho, que era espaçoso. Noutro dia provei a ela que a cortina me segue, independente da minha distância dela, e da temperatura da água. Sou eu que sou azarado desse tanto, ou isso acontece com vocês também?

domingo, 24 de abril de 2011

Canções e Silêncio IV - O Fim da Jornada

Na divisão do mundo os três Deuses mais poderosos ficaram encarregados de cuidar de domínios diferentes.

Zeus ficou com os céus e a terra.

Posseidon ficou com os mares e oceanos.

Hades ficou com o submundo.

E agora aqui estou eu, o mais longe de casa que qualquer viajante pode chegar, para reencontrar e levar de volta a superfície o amor da minha vida.

Agora finalmente entendo porque Hades deu ao seu reino o seu próprio nome.

Hades apresenta-se como um homem velho, vestindo uma bela armadura, no entanto sua pele e o metal de sua armadura parecem ser feitos com o mesmo material que todo o resto de seu reino.

Trevas. Dor. Desespero.

O simples vislumbrar de sua face faria qualquer homem correr em busca de abrigo, mas eu não sou um homem qualquer.

Tenho uma missão e mesmo que todos os tormentos do Hades caiam sobre mim, eu irei cumpri-la.

“Tú, Orpheu, maior entre os poetas, vem ao meu reino, sem ser convidado e ainda causa mais problemas do que sua grandiosa imaginação pode conceber. Por acaso não sabe que meus domínios são conhecidos por não tolerar a presença de visitas inconvenientes?”

Sua voz era poderosa e sombria, o som ecoou por todo o salão.

“Se causei problemas peço perdão Senhor do Reino dos Mortos, mas venho aqui na esperança de desfazer um engano terrível. Minha querida Eurídice foi trazida aqui injustamente! Nós ainda tínhamos muito tempo para ficarmos juntos e este tempo foi retirado antes do que deveria, por isso venho reclamá-la de volta ao mundo dos vivos.”

O semblante do Deus das Trevas fica paralisado por um instante e depois se transforma em uma maligna gargalhada.

“Sempre soube que foste um bom poeta, mas não sabia que era também versado na comédia!
Pensa que pode entrar nos meus domínios e levar qualquer pessoa assim? Acredito que não tem ciência do tamanho do meu poder.”

“Conheço bem tua fama, Mestre do além-vida, mas estou disposto a qualquer coisa para levar minha doce amada. Farei qualquer coisa, sob qualquer condição que desejar.”

Um brilho maligno surge nos olhos de Hades.

“Se é assim, hoje é seu dia de sorte. Permitirei que leve Eurídice para a superfície com uma simples condição.”

“E qual seria, ó poderoso Hades?”

“Só poderá olhá-la quando a luz do sol tocar a pele de sua amada. Ela te seguirá e
você vai ter que confiar em minha palavra para tê-la de volta.”

“O que acontecerá se eu olhar para trás?”

“Nenhuma força na criação poderá devolvê-la a você. Nem mesmo se todos os meus irmãos se unissem teriam poder suficiente para entregá-la a você, portanto muito cuidado em seu caminho de volta...”

Apesar da aparente misericórdia do Senhor das Trevas, suas expressão deixava transparecer uma suave malícia e se tratando de Hades qualquer mínima desconfiança é motivo para o máximo cuidado.

“Agradeço Vossa misericórdia, Grande Hades. Partirei imediatamente.”

“Ao sair de meu palácio ela já o estará seguindo, e pode ficar tranqüilo, nenhum dos seres que habitam o Hades iram lhe fazer mal durante sua viagem.”

Saio com passos firmes do salão onde tive a audiência, pois agora finalmente estou próximo de reencontrar a razão da minha vida.

Assim que Orpheu sai do salão Perséfone vai ao encontro de seu esposo e fala:

“Não é de seu feitio fazer bondades deste tipo, principalmente ao se tratar de permitir que uma alma saia do seu território, meu esposo.”

“Não pense que estou amolecendo. O desafio que Orpheu se propôs é maior do que aparenta.”

“Mandará algum dos teus servos dificultar o caminho de saída dele?”

“Não é de nenhum dos habitantes do Hades que Orpheu deve temer...”

...

Em meu passo apressado para sair do Reino dos Mortos passo rapidamente pela Cidade dos Mortos e seu terrível guardião e chego no deserto de trevas que leva até o rio Estige, até o momento Hades parece cumprir com sua palavra e nenhum ser interferiu em minha jornada.

Mas de repente uma voz começou a falar comigo... Não era a da minha amada, era uma voz masculina e terrivelmente familiar.

“Cruzaste a mais longa aventura que qualquer ser pode cruzar. Parabéns! Será para sempre lembrado.”

“Quem é? Essa voz me soa familiar, mas não reconheço!”

Exclamei para que o misterioso locutor se apresentasse, no entanto parece que ele não me deu ouvidos.

“Será lembrado como o grande herói que salvou sua amada, ou o tolo que cai na mais épica piada de toda a Grécia? Mas ainda pode piorar! Imagine se vossa eminentíssima pessoa consegue sair triunfante desta história, com sua amada nos braços e ela simplesmente te abandonar daqui a alguns poucos dias”

Quem seria essa voz? Aperto ainda mais o passo para deixá-la para trás, mas mesmo assim ela parecia sussurrar ao meu ouvido.

“Você pode ouvir os passos dela? Nem mesmo seus próprios passos consegue ouvir, o que te garante que ela está te acompanhando?”

Terríveis palavras carregadas de veneno! Por mais que não quisesse prestar atenção não podia negar sua veracidade.

Meus passos não possuíam som, o que me garantiria que Eurídice ainda estaria atrás de mim?

Chego ao encontro da barca das almas e Caronte não troca uma palavra comigo durante toda viagem, a agonia de não saber o que realmente se passa se torna a pior de todas as dificuldades que encontrei em minha jornada.

Após chegar a outra margem do Rio Estige sei que faltam poucos metros para finalmente retornar a superfície e dar fim e esta terrível viagem, no entanto subitamente a voz retorna a proferir suas peçonhentas palavras.

“É isso, estamos aqui. Esse é o fim da Jornada do Mestre dos Poetas, conseguiu sua amada e poderá ser feliz para sempre. O que fará agora? Será que conseguirá cumprir com essa abominável missão de ser feliz para sempre?”

“Conseguirei sim! Vá embora demônio!”

Enquanto praguejava contra o ser invisível tropeço e uma série de pedras rolam atrás de mim, em um ato reflexo olho para trás para ver se minha amada estava bem.

Ela está estonteantemente linda, sua beleza faz parar o tempo ao nosso redor e um sorriso compartilhado brota em nossas bocas, corro para tocá-la, mas o locutor misterioso retorna a falar.

“Ela é realmente divina, deve ser mais bela ainda a luz do sol...”

“Não!!!!!”

Grito desesperado. A luz ainda não havia tocado sua pele de seda e olhá-la me fez quebrar o acordo com o Senhor do Submundo!

Criaturas feitas de trevas agarram-na e a levam de volta para a prisão do mundo além-vida e a visão dela sendo arrastada para lá gritando meu nome fica marcada para sempre em minha memória.

Saio da caverna aos prantos, tudo o que fiz foi em vão, nada parece mais fazer sentido... Mas espere... O que me fez criar tantas dúvidas e questionar sobre meu amor e minha missão? Hades havia prometido que nenhum dos teus servos iria atrapalhar meu regresso ao reino de cima. Reflito por instantes tentando lembrar da onde reconhecia aquela voz e chego a mais aterradora das conclusões.

Era a minha própria voz.

Eu minei a minha chance de felicidade. Eu destruí o meu próprio futuro. Penso que a ausência de sentido de minha vida pode ser solucionada se me suicidar. A covardia se torna tentadora.

No entanto, escolho outro caminho, vou cantar a minha jornada para todos os jovens apaixonados que buscarem conselhos, vos mostrareis que o pior inimigo que podem enfrentar são eles mesmo e que no final nossas vidas se resumem a canções e silêncio.

FIM

Notas do Autor:

Espero que tenham gostado dessa pequena história e peço perdão pelo espaçamento que existiu entre cada capitulo. O tempo foi necessário para ajudar a amadurecer os textos e não tornar ainda mais dolorosa a sua confecção.

Não lembro se já havia dito isso antes, mas gostaria de lembrá-los, caros leitores, que os mitos são formas de contar histórias que nunca aconteceram, mas que podem acontecer em todos os lugares, portanto não existe um Orpheu, uma Eurídice e um Hades, nós somos todos os personagens ao mesmo tempo.

Sem mais. Obrigado.

Titanomaquia – Adendo



No princípio havia o Caos, e todo o universo fervilhava na inconstância de paradoxos de existência. E a partir do primeiro momento em que Caos agia de forma imprecisa e direta, errônea mas acertada, lá estava Chronos, para observar tal ação, pois Chronos é o tempo, e como tal existe além do universo, mas aquém da liberdade para com o mesmo.

Caos, de suas entranhas difusas, gerou cinco entidades primordiais. Primeiramente Érebo, a escuridão devastadora. Depois Gaia, a produtora de vidas. Em terceiro lugar surgiu Eros, o amor, o principio ordenador do universo. Posteriormente o abismo do mundo inferior, Tártaro. E por fim Nix, a noite.

Após estes acontecimentos Eros se voltou para o Caos transmutando-o em Cosmos, o universo ordenado. Érebo estabeleceu as escuridões completas pelo universo. Gaia recobriu Tártaro, guardando-o em seu interior. Entretanto, antes de Gaia gestar qualquer forma de vida Nyx entrou em cena, gerando as entidades que acompanhariam tudo que é vivo para todo o sempre.

Em primeiro lugar Nix gerou Moros, o destino, que guia tudo que há em qualquer plano de existência. Depois vieram os gêmeos, Tânatos e Hipnos, pois tudo que é vivo morre, mas também descansa, cria e sonha.

Nyx gerou espontaneamente muitas outras entidades, entre elas Urano, o qual todas as noites vinha deitar-se sobre Gaia...

- Mas esta história você já conhece, jovem Zeus.

- Sim Óbulo, obrigado por saciar minha curiosidade, fico me perguntando como você sabe de tantas cosias.

A águia olha ternamente para o adolescente a sua frente. – Apenas sou agraciado com um dom meu rapaz, apenas isso.

- Certo Óbulo, mas agora estou mais intrigado com toda essa movimentação dos Curetes, onde estarão indo?

- De certo uma armadilha foi ativada, por que não segue na mesma direção e descobre Zeus?

sexta-feira, 22 de abril de 2011

Titanomaquia: Parte 1 – A Senhora do Universo

Capítulo 8

Após anos na caverna Zeus já era um jovem saudável e forte, pois diversas criaturas das florestas vinham lhe trazer alimentos, enquanto os Curetes treinavam seu corpo, desde cedo, para qualquer batalha.

Zeus também cresceu em sabedoria, todos os dias a águia Óbulo voava pelo mundo e a noite pousava na caverna para contar as histórias que presenciara para o pequeno deus.

Mesmo com a formação dessa rotina Amaltéia não conseguia se tranqüilizar. Havia poucas notícias dos Titãs, e todas desencontradas. Nos primeiros meses todos nas proximidades da Caverna Dicte se mantinham a postos. Hidas produziu diversas armadilhas e todos os dias verificava cada uma delas. Célmis mantinha todos alertas para os detalhes. As matas próximas estavam repletas de ninfas vigilantes. Mas, depois de uns anos os Curetes começaram a relaxar, as ninfas deixaram de povoar maciçamente os bosques e quanto mais ela via isso acontecendo, mais desesperada ela ficava.

Amaltéia acreditava que eram nesses momentos que as coisas dão errado, quando nos deixamos cegar pelo inerte caminho da rotina.

Um dia, enquanto Zeus a beira de um córrego ouvia Óbulo narrar o nascimento dos gêmeos Tânatos e Hipnos, Amaltéia desabafou suas preocupações para Hidas.

- Minha cara, não há motivo para tais preocupações. Os Titãs não estão próximos, você não me vê trabalhando por perto por que, atualmente, tenho meios de perceber a aproximação de qualquer ser estranho a uma enorme distância. A mata está embrenhada de armadilhas, não olho cada uma delas agora por que há tantas que seria necessário um exército para ativar todas.

- Obrigada Hidas... É bom saber que vocês estão cuidando de tudo. Mas não sei, sempre me assusto com a possibilidade de que os Titãs invistam contra nós e ocorra um massacre.

Ao dizer isso Amaltéia estava com seus belos olhos azuis opacos e tristonhos. Não podia deixar de pensar nos horrores que os Titãs ou qualquer enviado deles poderia fazer com todos ali. Zeus era poderoso, ninguém sabia ao certo o quanto, mas será que os outros também o seriam?

- Amaltéia, sou de opinião que esse não é a única coisa que te aflige.

A ninfa olhou para o Curete, sua face transmitia um cansaço profundo.

- Hidas, o que vamos fazer? O tempo está passando, Zeus está mais forte, um dia ele terá de se levantar contra Cronos... e eu não vejo como isso pode dar certo!

O Curete ficou pensativo. Ele não sabia como responder. Ninguém sabia.

Nesse instante um forte ruído seguido do som de sinetes chamou a atenção de todos. Vinha da parte Ocidental da floresta. Hidas se levantou de um salto, uma das armadilhas foi disparada!

Célmis gesticulava ordens precisas, direcionando sua equipe em duplas de ataque, que se movem mais facilmente dentro da floresta. Como batedores do grupo estão Damnes e Herácles, os demais seguem em intervalos. Logo atrás destes Alcmon e o próprio Célmis. Depois, Paione e Hidas. Em seguida Hepimedes e Jásio. Por fim vai Êonis, o curandeiro.

Todos correm no mesmo ritmo, cada um portando seu respectivo equipamento. Em poucos minutos chegam até o local de onde veio o som da armadilha. Lá, preso por um emaranhado de cordas se encontrava um lobo de grande porte e olhar selvagem.

- Vejam só, é apenas um animal estúpido! Disse Damneus com escárnio para os demais. Entretanto seu coração gelou de espanto ao ouvir atrás de si uma doce voz que anunciava a presença de mais alguém.

- Então estes são os Guardiões que Réia mantém a seu serviço, os lendários Curetes! Resta saber apenas, o que tão vistosos guerreiros estariam guardando...

Ao se virarem os Guerreiros contemplaram uma jovem de incrível beleza, seus cabelos eram escuros e dependendo de como a luz bruxuleante da floresta lhes atingia pareciam refletir um tom azulado, sua pele levemente bronzeada condizia com o vermelho vivo de seus lábios e o negro profundo de seus olhos parecia sugar o espectador como o repuxo do mar.

Firme, Paione se adiantou e falou com a jovem, enquanto os demais se mantinham a postos e a beldade movia lentamente suas mãos, numa espécie de dança cadenciada.

- Minha bela dama, seria até mesmo desonroso termos de combatê-la, de certo não pretendes fazer mal algum a nós. Estou correto?

Olhando para ele com um sorriso irônico a beldade responde: - Já fiz, pobre mortal... Já fiz!