quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

já no ônibus...



Nesse primeiro ano morando longe de minha cidade natal aprendi muitas coisas: amadureci, faço arroz, sou mais responsável, faço arroz, planejo meus gastos, faço arroz e uso a máquina de lavar, por exemplo, porém, algo que me chamou atenção foi descobrir que as viagens de ônibus parecem seguir padrões, e o que as fazem ser diferentes somos nós: se está com sono, viagem tranquila e "rápida"; se tem um MP"x", viagem com distração; se tem companhia, viagem mais interativa, se está doente, viagem mais tensa, e assim por diante. Mas nesse texto vou escrever sobre os fatores externos, os que fazem a figuração da sua viagem.

Comecemos no terminal: ônibus de viagem raramente atrasa, mas as pessoas que vão viajar nunca o deixam de fazer. Bagageiro fechado, passageiros contados, portas fechadas, motor ligado e um sujeito correndo, carregando cinco mala, há dez metros do ônibus pedindo para esperar. Desliga o motor, abre portas, abre bagageiros e reconta passageiros.

O que mais gosto dentre as diferenças dos ônibus de viagem e os de linha é o conforto. Porém sempre tenho a impressão de que a pessoa da minha frente goza mais desse fator do que eu, quando ela reclina sua cadeira quase no meu colo. Outra coisa que gosto é a da praticidade, o simples fato de comprarmos cadeiras numeradas me convence de que a sociedade está evoluindo. Isso significa a certeza de que viajarei sentado. Mas sempre tem alguém que acha que é o sortudo que comprou uma cadeira com a do lado vazia ou se senta na janela do vizinho (sim, é preferência nacional a janela) e se faz de surpreso quando o dono da poltrona chega.

Tudo certo, estamos saindo, trânsito fluindo bem, cinco minutos de estrada e alguém se levanta, esbarra numa pá de ombros, e vai direto ao banheiro. Por que não foi A) no terminal?; B) com o ônibus parado? Eu digo A por conforto, tranquilidade e até higiene e B porque na melhor das hipóteses o sujeito vai fazer o número 1, e com o ônibus em movimento potencializa-se a chance de errar o alvo e o ônibus ficar fedendo pelo resto da viagem. Mas se for um número 2 tão urgente assim, o cara deixaria o ônibus fedendo mesmo se este fosse livre de atritos, esférico, no vácuo e nas CNTP.

A frente do ônibus é a parte geriátrica do veículo, abrigando as coisas (ou pessoas) mais antagônicas dele: as velhinhas. Sim, velhAs. Os vovôs deitam e dormem como se não houvesse amanhã, mas as vovós, essas podem ser as mais adoráveis criaturas, quando caladas ou quando te oferecem dinheiro (esse segundo tipo nunca encontrei). E mesmo no primeiro tipo fica-se aquela tensão de que falarão a qualquer instante, se transformando na velhinha-chata-do-ônibus-de-viagem-que-senta-do-seu-lado, e essa fala de vida dela, da vida dos filhos, porque tá viajando, da receita que a falecida mãe deixou, de que queria ter um pônei, e vários outros assuntos (mas esses são os clássicos, menos o do pônei).

Em contraste com as pessoas idosas, sempre estão "elas", as incansáveis crianças. Sendo justo: também existem as adoráveis, as caladas e/ou dormindo. O resto inventa uma forma de ser chata e fazer os pais se arrependerem de não terem usado camisinha. Músicas escolares, hiperatividade física, perguntas do tipo "por que?", reclamações e choradeiras. Isso quando não ficam encarando os outros passageiros. Se eu não fosse um Lord Inglês, faria sinais obscenos com a mão (advinhem: eu não sou um Lord Inglês).

Finalmente chegamos a cidade destino, não disse na rodoviária, mas isso não impede das pessoas se levantarem, pegarem suas malas de mão e formarem uma fila pelo corredor todo. Nunca vi lógica nisso, mas... E quando se percorre o corredor olhando para as cadeiras vazias passadas, logo se ve sacolas, garrafas e papéis. Então desço do ônibus, agradeço ao motorista por não ter tomado drogas vendidas ilegalmente para o manter acordado, o que provoca déficit de atenção e diminuição da velocidade de respostas de reflexos, e por conseguinte acidentes (mesmo assim, só viajo de madrugada, adoro emoções fortes), pego minhas malas e tomo meu rumo, repassando na cabeça o que aconteceu na viagem.

3 comentários:

Ludmilla disse...

você acabou de me chamar de geriátrica: adoro as primeiras poltronas! e justamente por isso, contesto o que você disse sobre as velhinhas. as que têm netos, falam deles. as que não têm, falam de doença.

Brinquedo Mestiço disse...

Texto sensacional, e o melhor... FACTUAL!
Muito bom Igor, muito bom mesmo : ]

Wolv disse...

Vei, eu fiz uma análise parecida nos meus primeiros anos de faculdade, e gostaria de adicionar aos teus comentários que, além das velhinhas e crianças, os bancos da frente, mais exatamente do 01 ao 11 são nos que há a maior probabilidade de se sentar uma gostosa do teu lado.