quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

Lua nova - Parte 1/2

Noite fria e escura, típica da fase nova da lua. Ricardo olha para a porta do prédio cinza e mal acabado da DPO de Santo Amaro. Definitivamente ele não queria estar ali.

Após respirar fundo aperta com força a alça da valise preta com sua mão direita enquanto retira o suor da testa com as costas da outra. Ele caminha para a entrada, no saguão principal, um ambiente relativamente pequeno de trinta metros quadrados, com várias cadeiras e uma escrivaninha.

- Senhor Ricardo, o delegado está te esperando na sala dele. Avisou respeitosamente o jovem secretário de trás da mesa.

Com um aceno de cabeça e um sorriso Ricardo passa por ele e entra em um corredor. A gola da camisa social parecia apertar seu pescoço. Mais alguns passos até o escritório do delegado.

Da porta ele vê um homem baixo e gordo, vestindo um terno marrom e uma camisa social listrada sem os botões da barriga. Olheiras profundas denunciavam tempos difíceis e muitas noites em claro. Bem, Ricardo sabia que todos na região tinham um motivo para não dormir bem. Ele estava ali para ver esse motivo. Entretanto a garrafa de uísque pela metade lhe dizia que algo estava errado.

- Então, Doutor Ângelo, você conseguiu! Capturou o assassino. Sabe, fico muito feliz com isso. Mas, o senhor não esclareceu as coisas pelo telefone... O homem que vocês tem aqui é apenas um suspeito? Ou pegaram-no em flagrante? Houve outro assassinato?

O homem na escrivaninha sequer olhou para cima. Apenas virou outro copo do líquido e manteve os olhos na parede a sua frente.

- Ele se entregou Ricardo. O desgraçado veio aqui, exatamente onde você está, sorriu e disse: “Eu tenho feito coisas muito, muito más, senhor policial.” Então deu uma gargalhada.

Ricardo continuava olhando para o delegado, fazendo o possível para não externar seu desconforto. Então, o assassino em série simplesmente veio e se entregou.

Bem, não é de todo sem sentido, na sua mente ele deve precisar de uma plateia interativa, com a qual ele possa jogar e afetar, como o delegado aqui.

- Sou um inútil Ricardo?

- Perdão senhor?

- Ele pensa que sou um inútil. Nunca pegaria ele. Eu já imaginava que ele fosse confiante, mas, não sei, isso é demais, sabe? Aí ele veio, ele veio e riu! Desgraçado!!! Vai apodrecer na cadeia!!

A essas alturas o delegado já dava murros na mesa. O suor lhe escorria pelo rosto transfigurado pelo ódio. Um homem acabado e humilhado, bufando de raiva.

- Bem... se é esse o caso Ângelo. Por que me chamou aqui?

- Por que quero ferrar esse infeliz. A procuradoria e a defensoria pública já estão tomando suas providências, mas veja, não temos provas, ele pode ser só um idiota fingindo ser o que não é, pode ser uma distração, pode ser a merda de outro plano. Preciso de um parecer profissional, quero saber se esse é o nosso cara, se ele é perigoso. Preciso saber tudo antes que a PF apareça aqui amanhã com duzentos peritos à tira colo e tirem ele de mim! Eu vou acabar com a vida desse infeliz, assim como ele acabou com a minha!

- Sabe que não tenho muita experiência com isso, certo?

- Você quer o que Ricardo? Aonde vou arrumar um psicólogo criminal com experiência “nisso”? Ou um psiquiatra de confiança em plena madrugada? Você é novo, mas vai servir. Apenas vá lá e faça algo. Saldanha! Ei, leve o doutor aqui até a sala do maníaco.

O soldado Saldanha era um homem com seus 35 anos. Magro, não muito alto e visivelmente transtornado. Mas Ricardo não o julgava por isso, nem pelo modo como suas mãos tremiam ao procurar as chaves da sala de interrogatório. Esse policial provavelmente estava acostumado com acidentes de carro, ladrões, drogados, traficantes. Com certeza já havia participado da prisão de um ou outro assassino passional. Mas nunca algo como este homem. A polícia local contabilizava 15 mortes em um mês. Muito foi abafado mas a grande imprensa já fervilhava. Ricardo sabia que já havia agentes da Polícia Federal na cidade investigando. Sabia também que eles só não estavam ali naquele momento por que Ângelo devia ter negligenciado a ação de dar esse informe.

Na frente da sala há três policiais que abrem caminho, provavelmente ouviram dali os urros do delegado.

Ricardo para diante da porta enquanto Saldanha se atrapalha com as chaves. Ele sente como se fosse partir a alça da valise com a mão. A porta se abre, e sentado diante de uma mesa se encontra um homem alto, de boa aparência, cabelos escuros e curtos, trajando uma roupa social estranhamente bem alinhada para a situação. O homem encara o psicólogo e sorri.

4 comentários:

Taíla Castro disse...

Segunda parte!!!
É só o que digo pra você!!

Excelente texto Dedé!!!
*.*

Tarso "Carioca" Santana disse...

Bom texto!

Fazia tempo que não rolava nada do tipo no blog.

Em breve teremos novidades da minha parte também.

Taíla Castro disse...

Só falo uma coisa pra você Dedé: se-gun-da par-te!!!!! Pra ontem!!
:P

Muuuuito bom, tô muito curiosa pelo resto!

Wolv disse...

Muito bom... como sempre, anseio pelo restante.